terça-feira, janeiro 27, 2004

Isaac Ribeiro - Enviado a João Pessoa

A cidade de João Pessoa (PB), dá um bom exemplo de como aplicar verba pública na área cultural, oferecendo à população onze dias de intensa movimentação cultural. É o festival Centro em Cena, que em sua quarta edição segue até o próximo dia 24 apresentando artistas e grupos locais e de várias partes do País. Os principais espetáculos são apresentados na praça Antenor Navarro, na parte histórica da cidade - uma espécie de Ribeira que deu certo.

Ao contrário da vergonhosa e estagnada situação que o tradicional bairro histórico natalense vive, o Centro Histórico de João Pessoa é inundado por cultura para a felicidade dos paraibanos. A reportagem da TRIBUNA DO NORTE foi convidada do evento e viu tudo de perto.

O Centro em Cena é realizado pela Fundação Cultural de João Pessoa (Funjope), desde 2000, com o apoio do Governo e da Prefeitura, e integra o calendário oficial de eventos da cidade. Iniciado no último dia 14, já passaram pelo festival alguns dos principais nomes da cultura paraibana em atividade e artistas de renome nacional como o paraibano Chico César (que abriu a programação), Arnaldo Antunes, Cabruêra, Balé Popular do Recife, Paulo Goulart Filho, Rogério Faisal entre outros, além do grupo peruano Spacio Danza.

A programação ainda tem, até o dia 24, palestra com o jornalista Mino Carta, mostra de curtas-metragens Mix Brasil, palestra com o escritor João Gilberto Noll, Ballet de Londrina (PR), mostra de curtas de animação Anima Mundi, peça "Credores", com Alessandra Negrini e Marcos Winter, Lanlan & os Elaines, grupo teatral XPTO (SP) e encerrando, a banda carioca Los Hermanos.

Além das apresentações, o festival ainda oferece oficinas e workshops de percussão, música eletrônica, discotecagem, produção musical, dança contemporânea, filosofia e capacitação de animadores. Há também uma programação paralela.

"Trata-se de uma programação rica e vasta para todos os gostos, que vai desde a cultura popular à erudita. É importante lembrar que o Centro em Cena acontecerá em diversos espaços, em horários diferenciados, para que o público tenha a oportunidade de assistir a todos eles", diz Antônio Alcântara, presidente da Funjope, que enfatiza ainda que o principal objetivo do festival e incentivar e "dar voz e vez" as mais diversas formas de expressão artística.

Em cena

Um grande palco foi armado na praça Antenor Navarro, e uma estrutura de som, luz, banheiros químicos, cadeiras, seguranças contratados e Polícia Militar garantia o conforto e o prazer do público, que compareceu em bom número na noite do último sábado, dia 17. A primeira atração foi o Balé de Teresina (PI) com "Coco Peneruê", remetendo à África. Depois foi a vez da ótima Icógnum Cia de Dança, de Recife (PE) que, com movimentos ora desconexos ora acrobáticos, interpretou a coreografia "Manipulares", abordando aspectos da manipulação cotidiana a que as pessoas são submetidas. O grupo foi bastante aplaudido. Já o grupo Mosaico, do Mato Grosso, não foi muito feliz na encenação do "Auto da Estrela Guia", arrefecendo os ânimos.

Após a apresentação teatral, as cadeiras foram retiradas da praça para a apresentação do grupo paraibano Chico Correia & Eletronic Band, uma das boas revelações do pop nacional, sucesso de crítica na última edição do Tim Festival. Não dava para negar que a maioria do público estava ali para ver o grupo - que faz uma elegante mistura de música eletrônica e orgânica, com pitadas de jazz fusion e fortíssima personalidade nordestina, muito pela voz de "taquara rachada" (no melhor sentido possível) da vocalista Larissa Montenegro, personalíssima.

Chico Correia fez uma excelente apresentação, colocando todo mundo dançar seus e cós de dub e drum'n'bass, enquanto o telão exibia imagens em preto e branco e outras psicodélicas. Como se costuma dizer por aí: é uma banda pronta! Nos camarins, enquanto os próprios integrantes guardavam toda a parafernália de máquinas, laptop, pick-ups, tambores e outros instrumentos, o percussionista Cassiano comentava: "O show foi bom, mas poderia ter sido melhor. O público ficou esperando uma reação nossa que não veio." Bem, para quem estava na platéia, a reação veio logo nos primeiros acordes e bips. Chico Correia parece um cientista em meio a vários equipamentos, apertando botões e vez por outra empunhando uma guitarra espacial.

Mas a festa não terminava quando as luzes do Palco 1 eram apagadas. O Centro em Cena tem eventos realizados em 13 espaços diferentes, sendo 11 deles no Centro Histórico. Nos arredores da praça Antenor Navarro, havia ainda o Palco 2 (onde a banda Cabeça Chata (PB) tocou após Chico Correia), a boate HiFi, Casarão dos Arquitetos, a Cantina de Dona Hilda, além dos bares da área.

No início da noite, às 18h30, no Casarão dos Arquitetos, foi realizada a exposição "Retrospectiva Solha", do artista plástico WJ Solha, paulista, radicado em João Pessoa. Ele expõe trabalhos figurativos bastante interessantes, em tinta acrílica sobre tela, numa espécie de realismo fantástico onde são reproduzidas cenas cotidianas com personagens típicos das ruas da capital paraibana; ilustres anônimos, loucos e mendigos. Ao lado de cada quadro dessa série, a fotografia de Antônio David da qual foi reproduzida. Em outra série, Solha funde referência e citações a Picasso, principalmente, tudo com um certo ar de Pop Art.

Na programação do domingo, dia 18, a maior atração foi Sivuca e a Orquestra de Câmara de João Pessoa, na praça Antenor Navarro. O Teatro Santa Roza, os atores Paulo Goulart Filho e Norma Gabriel apresentaram a peça "O Cavalo na Montanha", com texto de José Antônio e direção de Bárbara Bruno. Em cerca de 50 minutos de duração, a peça mostra a conturbada e misteriosa relação de uma garota/mulher com seu potro/cavalo/gente.

O fraco texto é ilustrado pela performance acrobática de um seminu Paulo Goulart Filho, que rola pelo chão, escala cordas pelo palco, se contorce e ainda fala (isso quase no final). Destaque para a maquiagem de cavalo do protagonista.

Já na praça Antenor Navarro, a platéia esperava o início da hilária peça "As Malditas", com a Cia Paraibana de Comédia. Dois ótimos atores interpretam as irmãs Rosa e Margarida - a primeira, após um derrame, fica presa a uma cadeira de rodas sob os cuidados da outra irmã. As duas se odeiam e protagonizam momentos engraçadíssimos. É impressionante ver como o público paraibano gosta de cultura e aplaude de maneira efusiva, empolgada e contagiante.

O Centro em Cena segue até o próximo sábado, apresentando excelentes produções em cinema, música, artes plásticas, teatro. Entre as boas opções estão palestra com o escritor João Gilberto Noll (hoje), mostra itinerante de curtas-metragens Mix Brasil (hoje), Ballet de Londrina (amanhã), Espacio Danza, do Peru (amanhã), mostra itinerante animação Anima Mundi (amanhã), LanLan & os Elaines (quinta), a peça "Os Credores", com Alessandra Negrini, Marcos Winter e Emílio de Melo (quinta-feira), grupo teatral XPTO (sexta-feira) e Los Hermanos (sábado).




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